24 Julho 2007

Um «Pluralismo Limitado»

1. O indesmentível e desejável pluralismo social e cultural reais de uma sociedade/comunidade aberta dos nossos dias (que é tanto um pluralismo horizontal, como um pluralismo vertical), se implica decerto um relativismo moderado, no que respeita a valores e a perspectivas, e mesmo um pluralismo axiológico, não se confunde seguramente e é mesmo incompatível com o «relativismo radical anti-normativo» (ou relativismo absoluto, dito por alguns de «pluralismo integral», e por outros ─ JOHN GRAY ─ de «pluralismo objectivo e radical dos valores», radical value-pluralism, ou objective pluralism of the radical sort, que radica na «radical incomensurabilidade dos valores» de JOSEPH RAZ, ou ainda, de «pluralismo intratável»), porquanto aquele primeiro não abdica de um núcleo essencial (hard core) mínimo de valores fundamentais comuns, tanto no momento objectivo-comunitário, como no momento antropológico fundamental.

O que quer dizer que o próprio pluralismo tem um limite: sem um mínimo de um comum universal de valor ou de validade (ou de uma «forma de vida comum», no dizer do mesmo JOHN GRAY) não é possível qualquer comunicação e a ruptura absoluta exclui mesmo o conflito.

Este referente comum mínimo não pode deixar de ser, hoje, por um lado, a concepção do homem como «pessoa» e, por outro lado, a concepção da sociedade como uma «comunidade de pessoas». Mesmo a democracia liberal ocidental não prescinde de um referente axiológico central, comum e universal, que é a pessoa humana individual e, pelo menos, os valores da liberdade e da igualdade.

2. Mas, apesar deste pluralismo axiológico limitado ─ e justamente com ele ─, é perfeitamente defensável uma «unidade ontológica de (toda) a ordem normativa cultural», i. é a existência de um mesmo fundamento ontológico comum a todas as várias ordens normativas, seja esse fundamento, para uns, já de origem divina, seja ele, para outros, um mesmo poder ou fonte seculares, seja ele ainda uma mesma comunidade, seja ainda uma mesma natureza humana comum e universal.

Quanto a nós, esse fundamento é a autónoma pessoa humana individual e as suas dignidade e unidade. Mas pode ver-se, sobre o tema, SOARES MARTÍNEZ, Filosofia do Direito, Coimbra, 1 991, p. 230 e seguintes.

Esta unidade ontológica é incompatível, tanto com o unanimismo arcaico, tribal ou colectivista, ou com uma acrítica homogeneidade social e cultural massificada, como com o referido relativismo radical, absoluto ou anti-normativo. Mas é perfeitamente compatível com aquele, referido por nós, pluralismo (axiológico, jurídico, social, político, económico e cultural) limitado ou relativismo moderado: ou, afinal, «pluralismo razoável» (reasonable pluralism), na fórmula de JOHN RAWLS.

Coimbra, Julho de 2 007.

Virgílio de Jesus Miranda Carvalho.

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